Texto escrito por Sarah Anne Lawless Compilação e tradução por Daniel Seaxdéor
Este texto foi feito a partir da tradução de vários outros de Sarah Anne Lawless, e eu, o tradutor, não posso me considerar autor, apenas compilador das palavras de Sarah, as quais organizei de uma forma a não ficarem repetitivas, mantendo a lógica e expondo o melhor possível a bela visão da autora original. Não fiz inserções no texto, me limitando a apenas encaixar suas partes.
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Minhas crenças e práticas caem no reino da bruxaria tradicional. É mais por causa do meu mergulho na bruxaria e magia popular escocesa-escandinavas. Eu fui atraída e obcecada com a bruxaria tradicional antes que a pletora de livros, fóruns, e websites viessem à existência. Eu fui criada na carne e ossos em contos de fadas, folclore, lendas e mitologia. Isto significa que eu, entenda, não fui influenciada por Andrew Humbley e o Cultus Sabbati nem fui eu influenciada por Robin Artisson. Eu continuo não sendo influenciada por eles nem interessada neles. Eu não sou atraída pelo alto cerimonialismo e linguagem enfeitada de Chumbley e Shulke (embora eu admita que a poesia de Chumbley é deslumbrante e as ilustrações de Shulke podem ser “bruxescas” num sentido que é orgasmático). Eu também não estou atraída pelo ofício (craft) pseudo-corneano e o reducionista germânico de Artisson que toma muito de praticantes como JackDaw e Gemma Gary. Eu, todavia, admito ter uma antiga paixão pelo cérebro de Robert Cochrane e ter amado Doreen Valiente mais do que uma bruxa comum. Mas certamente são Baba Yaga, Habetrot, Holda e a Rainha de Elphame que têm meu coração. Em vez de juntar-me a uma tradição da moda, eu escolhi a Crença das Fadas e mergulhei profundamente no trabalho com espíritos.
Eu acho estranho e curioso que, embora eu seja considerada uma bruxa tradicional, eu não fui influenciada pelas mesmas tradições e escritos que a maioria das bruxas tradicionais modernas comumente são. E não li Jackson e Howard, eu li Jones e eu queria não ter o feito (ele precisava de um editor realmente bom). Eu ignorei Xoanon, Pendraig, e Fulgur e li Paul Huson, herbários e livros velhos e empoeirados de folclore, em vez disso. Eu li os escritos de Robert Cochrane e os amei, mas segui os passos de Joe Wilson de volta à terra com meu tambor. Meus heróis são mulheres folcloristas como a Dra. Hilda Ellis Davidson e F. Marian McNeill. A despeito de não compartilhar as mesmas influências com minhas companheiras bruxas, eu terminei sendo uma e não menos que uma.
Qual é a minha explicação para vocês, outras bruxas tradicionais novas e antigas? Que não é o que ou quem você lê, mas o que você faz que compõe o que você é. Um autor ou publicador não define nosso caminho ou faz alguém mais bruxa que outra pessoa. Não deixe ninguém intimidar você dizendo outra coisa. Coloque de lado seus livros e segure seu cajado ou bastão e encontre-se numa encruzilhada e invoque o mais antigo professor de todos se você for capaz. Vá lá fora e encontre o seu caminho.
A maioria dos caminhos de bruxaria mais tradicional são de origem europeia, mas não todos. Semelhanças centrais seriam trabalhar e se comunicar com os espíritos, trabalhando com elementos da natureza, culto aos antepassados, um certo nível de animismo e um uso geral da magia popular (baixa magia) em oposição à alta magia, mas algumas tradições usam magias superiores. No geral, eu diria que a bruxaria tradicional é principalmente um caminho de indivíduos, famílias e grupos muito pequenos. Para mim, pessoalmente, o que distingue a bruxaria tradicional é que os praticantes baseiam suas práticas nas velhas tradições, encantamentos, baladas, superstições, coletâneas de conhecimento oral, práticas de bruxaria documentadas e rituais… Considerando que muitas bruxas tradicionais veem wiccanos e neopagãos como praticantes cerimoniais baseados em conhecimento (lore), bem como conhecimentos (lore) e práticas modernas – não necessariamente falso conhecimento (fakelore), mas rituais e crenças decorrentes dos dias modernos. Muito do que praticamos é da Idade Média e mais tarde, mas muitas bruxas tradicionais incorporam tradições e crenças mais antigas em seu ofício. Então, se você ouvir quaisquer bruxas tradicionais ou grupos que reivindicam ancestrais há milhares de anos ou que descendem de uma linha contínua de bruxas por centenas de anos, não acredite nisso.
INTRODUÇÃO À BRUXARIA TRADICIONAL
Eu já vi muitas tentativas de definir o que é a bruxaria tradicional (Traditional Witchcraft) desde que ela recentemente foi popularizada através da internet e da publicação de livros, mas a maioria destas definições parecem apenas incluir o que ela não é ou são extremamente ambíguas e confusas.
A maioria das pessoas acha que é uma tradição como a wicca, mas é realmente um termo genérico sob o qual muitas tradições de bruxaria florescem. A bruxaria tradicional atraiu muitos recém-chegados desde 2004, pois é atualmente a “coisa da moda” para se rebelar contra a wicca e buscar algo que não seja “falso”. Essa é uma mentalidade ridícula, já que as partes que compõem a wicca não são de modo algum falsos e muitos são tão antigos quanto as crenças e práticas dos reconstrucionistas e das bruxas tradicionais. Só porque a wicca não é sua xícara de chá, não significa que a bruxaria tradicional será, não é um refúgio para se correr, mas um caminho extenso e exigente a seguir.
As definições mais comuns tendem a dizer que a bruxaria tradicional é: a) a bruxaria tradicional das Ilhas Britânicas (Irlanda, Escócia, Gales, Cornuália, Inglaterra, etc.) variedade que é “tudo menos wicca”; b) bruxaria tradicional baseada na Europa (comumente apenas as bruxarias e magias populares germânica, celta, basca, italiana e grega), mas não neopaganismo ou reconstrucionismo, e é também da variedade que é “qualquer coisa, menos a wicca”; c) uma tradição de bruxaria longamente estabelecida (tradição, todavia, sendo usada no sentido moderno derivando do seu uso em tradições wiccanas), comumente referindo-se à bruxaria hereditária tanto ficcional como não ficcional – a última sendo mais da magia popular ou da categoria de habilidade psíquica hereditária; d) e por fim a mais ambígua forma de qualquer coisa que não seja a wicca, não-neopagã, não-“fofa”, não-religioso “ofício” (craft) ou “habilidade” (skill), uma bruxaria comumente praticada por pessoas solitárias.
As definições acima realmente não servem para mim (já que eu prefiro minhas definições sem ataques à wicca) e também não explicam bem como o termo é aplicado hoje comparado com o que ele realmente representa quando o assunto é um caminho ou tradição de magia e espiritualidade hoje.
A bruxaria tradicional na cultura moderna passou a significar qualquer bruxaria ou tradição ou práticas associadas a Robert Cochrane, Joe Wilson, Evan John Jones, Andrew Chumbley, Mike Howard, Nigel Jackson e Robin Artisson. Quando as pessoas interessadas no ofício (craft) começam a pesquisar a bruxaria tradicional, são os trabalhos e legados dessas pessoas que eles descobrem. O que eles não sabem é que a bruxaria tradicional é muito maior do que qualquer outra tradição. É um termo muito parecido com “pagão” ou “reconstrucionista” para classificar todas as centenas de tradições e práticas que se enquadram em seu abrigo. Bruxaria tradicional, quando não se refere a tradições específicas (1734, Clan of Tubal Caim, Cultus Sabbati, Anderson’s Feri, etc.), é um termo genérico para tradições variadas de bruxaria – algumas são baseadas na cultura (ou seja, spæcraft, seiðr, brujeria, streghoneria); alguns são baseados na prática (ou seja, bruxaria liminar (hedgewitchery), bruxaria verde, bruxaria de cozinha) e podem ser encontrados em outras formas de bruxaria; por último, outras são tradições pessoais exclusivas do indivíduo. A bruxaria tradicional não é apenas o que a bruxaria “pode” ter sido de séculos a milênios atrás, mas como “era” em casos com documentação sobrevivente, conhecimento oral e práticas.
Eu sugiro, baseada em minha própria experiência, pesquisa e estando na comunidade da bruxaria tradicional antes que houvessem livros ou websites no assunto (ou pelo menos com as palavras “bruxaria tradicional” nos títulos), que existem duas definições separadas de bruxaria tradicional bem como quando alguém olha para uma palavra no dicionário há comumente mais de um possível significado. Aqui estão as duas que eu encontrei sendo usadas por praticantes e grupos em geral, ou pelo menos, como eles tentam defini-la.
DEFINIÇÕES
1. BRUXARIA DO INÍCIO DO PERÍODO MODERNO (1500-1900S)
Baseada na história e no folclore, dependente de crenças documentadas e práticas do início do período moderno da Europa.
Definição 1 – “bruxaria tradicional”: Uma bruxaria tradicional, magia popular, ou prática espiritual baseada nas práticas e crenças da bruxaria da Europa e nas colônias do início do período moderno que compreende os anos 1500s a 1800s. As crenças e práticas eram comumente os resquícios pré-cristãos de práticas mais antigas pagãs ou animistas que haviam sobrevivido no início do período moderno através dos contos populares e de fadas, baladas, canções, rimas, superstições, tradições rurais, e vários grimórios. Todavia, haviam bruxas, mágicos populares e grupos mágicos realmente praticando neste período, mas suas práticas e crenças teriam sido eivadas de conotações e mitologia católico-cristãs – mesmo que fossem finamente revestidas com as dos pagãos. Isto não significa que há uma tradição há muito estabelecida de uma linhagem de bruxas praticando dentro do paganismo, mas antes que apenas pequenos fragmentos do que “pode” ter sido antes permaneceu, ainda que as próprias bruxas e superstições camponesas não o saibam (o que eles provavelmente não sabiam). O “povo habilidoso” (cunning folk) é um bom exemplo da sobrevivência de tais tradições até meados dos 1900s nas áreas rurais das Ilhas Britânicas.
2. BRUXARIA TRADICIONAL MODERNA (1960S+)
Baseada em autor e personalidade, dependente dos ensinamentos de indivíduos com um vocabulário, crenças e práticas similares.
Definição 2 – “bruxaria tradicional moderna”: bruxaria tradicional como um termo modernamente aceito usado para se referir a um caminho específico da bruxaria e tradições dentro dela não existia até o início dos anos 2000. Antes dessa época, não havia literatura ou grupos reivindicando este termo na forma que ele é usado hoje em dia, mas muitas influências da bruxaria tradicional moderna vieram previamente em um período entre as décadas de 50 e 70. Estas influências iniciais mais comumente incluem Robert Cochrane, Paul Huson, Joe Wilson, Robert Graves e Victor Anderson. Os autores posteriores mais comuns os quais a influência levou à criação e a definições modernas de bruxaria tradicional de um período entre as décadas de 80 e 2000 incluem E. J. Jones, Michael Howard e seu periódico The Cauldron, Nigel Jackson, Nigel Pennick, Andrew Chumbley (após os anos 2000) e Daniel Schulke (após os anos 2000) – os últimos autores sendo amplamente influenciados pelos anteriores. Há também agora autores mais recentes e experientes na internet que agora têm seus próprios seguidores de culto devido à tradição e trabalho duro dos homens desbravadores que vieram antes deles. A maioria dos bruxos e bruxas modernos que reivindicam que praticam bruxaria tradicional são principalmente influenciados pela bruxaria sabática de Chumbley, o escritos de Robert Cochrane (também via Joe Wilson e E. J. Jones), e as práticas e crenças de Paul Huson em seu trabalho Mastering Witchcraft – quer eles reconheçam ou saibam disso ou não, uma vez que a tradição destes homens pode ter vindo indiretamente através de outra pessoa ou fonte.
DESAMBIGUAÇÃO
Não confundir com Bruxaria Tradicional Britânica/Wicca, que se refere às tradições alexandrinas e gardnerianas da wicca.
Como a bruxaria tradicional é diferente da wicca?
A bruxaria tradicional é vista como um ofício (craft) ou habilidade (skill) enraizada na superstição e não é considerada uma religião neopagã.Os covens têm uma diferente estrutura e hierarquia.A criação de círculo não é necessária para todos os rituais e feitiços.As crenças e práticas são mais acadêmicas; suas fontes são a história, arqueologia, antropologia e etnologia.É feita de indivíduos, famílias, e grupos bem pequenos em oposição a grande tradições estabelecidas.As crenças são baseadas em imaginário e simbolismo em vez de dogma.
CORRENTES DA BRUXARIA TRADICIONAL
Baseadas na cultura – ou seja, córnica, escocesa, islandesa…
Baseadas em grimórios – suas fontes são grimórios clássicos.
Baseadas na prática – ou seja, bruxarias verde, de cozinha, liminar (hedge).
Cochranita – tradição como ensinada por Robert Cochrane.
Feri ou Vicia – tradição como ensinada pelos Andersons.
Hereditária – bruxaria baseada em tradição familiar.
Luciferiana – baseada em mitologia e imaginário.
Sabática – o Cultus Sabbati e derivados.
A HISTÓRIA, TRADIÇÃO E IMAGINÁRIO:
A crença nas fadasA caçada selvagemO Sabbath das bruxasA Caça às bruxasO deus cornífero ou o deus bodeO homem de pretoA bruxa na história e literatura (Medea, Circe)
CRENÇAS E PRÁTICAS CENTRAIS
CRENÇAS
Estados alteradosCulto AncestralAnimismoEspíritos familiaresResponsabilidade pessoalO espírito multifacetado
PRÁTICAS
Ritual extáticoMagia operativaPossessão e Montaria da bruxaVidênciaTroca de formaVoo espiritual
ANCESTRAIS DA BRUXARIA TRADICIONAL
Charles Godfrey Leland
Robert Cochrane
Doreen Valiente
Victor Anderson
Sybil Leek
Paul Huson
CONCLUSÃO
No geral, a essência da bruxaria tradicional é levar as coisas adiante em seu caminho – estudo avançado, prática e experiências. Tentando encontrar as fontes, a história, e como e porquê para tudo o que as bruxas acreditam e fazem. A maioria das bruxas tradicionais eu sei que não leem livros pagãos – lemos textos antropológicos, arqueológicos, históricos e religiosos – então, como eu, elas podem complementar esse conhecimento com o folclore e praticar o que aprenderam em suas vidas diárias. Como uma bruxa tradicional, eu tento incorporar minhas artes e crenças em todas as partes da minha vida e em tudo que faço, não importa o quão aparentemente mundano seja o que eu estou fazendo. Há uma longa história de magia em qualquer ato cotidiano – e acho que uma curiosa bruxa tradicional sabe disso melhor que ninguém.
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Caso queira conhecer mais, sugerimos o artigo Introduction to Traditional Witchcraft (em inglês) de Sarah Anne Lawless o qual possui vários links explicando em mais detalhes as ideias aqui apresentadas de maneira resumida.
Fontes:
Texto retirado do Blog https://bosqueancestral.wordpress.com
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